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20181129

Prefácio: Dr. Abílio de Araújo: "Sabemos e Podemos, e Devemos Vencer!"

Foto Capa do livro 2018
PREFÁCIO

Bendita a hora em que o Rev. DR. Pe. Martinho Gusmão teve a inspiradora luz para pensar e depois se lançar na ingente obra de publicar esta magnífica Biografia de Nicolau Lobato, o Marxista Intelectual, com base nos Ensaios, Entrevistas publicadas, Artigos de Opinião e Discursos deste insigne filho de Timor.

Os continuadores da Geração de Nicolau Lobato podem, a partir de agora, aceder mais facilmente ao Pensamento de Nicolau Lobato, homem de estudo das Ciências e da sua aplicação prática no viver quotidiano como Filosofia, Matemática, Sociologia, Antropologia, Etnografia, Ciência Política e Liderança Político-Militar.

É para mim um privilégio e subida honra escrever este Prefácio, não obstante sentir ao mesmo tempo sobre os ombros uma enorme responsabilidade.


Muitos dos escritos ora vindos a lume são do período da época colonial portuguesa do antes e depois da Revolução dos Cravos de 25 de Abril, em Portugal, até à Proclamação da RDTL, em 28 de novembro de 1975 – a I Republica -, e depois da invasão indonésia da capital Díli, em 7 de dezembro de 1975, até à sua morte em combate, em 31 de dezembro de 1978. Foi o segundo Presidente da FRETILIN e segundo Presidente da RDTL tendo dirigido denodadamente a luta do Povo Maubere contra o colonial-expansionismo do regime militar e ditatorial indonésio de Suharto.

O seu desaparecimento físico, reconhecidamente precoce, deixou um vazio político enorme nos anos que se seguiram. Com a sua coragem e valentia demonstradas até à sua morte, juntamente com a sua companheira de todas as horas, deixou um exemplo imorredoiro. Com intervalo de poucos meses seguiu-se a morte dos seus companheiros Lear, Bi Lear, Sahe, Wewe (Dulce da Cruz), Hatta, Fonseca e tantos outros que, abnegadamente, sacrificaram as suas vidas. Dessa Direção da Luta que era o Comité Central da FRETILIN restaram apenas Kai Rala Xanana Gusmão e Ma Huno. Esses exemplos de sacrifício da própria vida continuaram a inspirar todos os novos dirigentes eleitos na I Conferência Nacional da FRETILIN, de 1 a 3 de março de 1981, como Bere Malai Laka, Kilik Wa’gae até Nino Konis Santana que também doaram a vida em prol do Povo e Nação Mauberes.

A II Republica iniciada em 20 de maio de 2002 tem honrado a sua memória com a atribuição do seu nome a Avenidas, Escolas e Instituições Militares. A estátua de Nicolau Lobato na Rotunda do Aeroporto coloca Nicolau Lobato empunhando uma arma automática e as bandeiras da FRETILIN e da RDTL. Contudo, os epítetos e monumentos, muito importantes para manter viva a sua figura na memória visual dos timorenses, não conseguem fazer jus ao Humanista, Pensador, Filósofo, Matemático e Político que foi Nicolau Lobato.

A síntese do Homem

Maubere na sua plenitude, revelada na firmeza de caráter até ao sacrifício da própria vida pela Libertação da Pátria e do seu Povo, só pode ser entendida quando nos debruçarmos sobre os escritos deixados por NL.

Esta biografia vem colmatar essa ausência de sistematização até hoje, e o desconhecimento pelas gerações atuais do Pensamento de Nicolau Lobato acrescentando-se assim esta obra literária e monumental aos demais monumentos existentes, e quiçá inspiradora de mais um ou outros Monumentos a serem esculpidos de Nicolau Lobato, em Timor Leste, onde se venha a enfatizar a personalidade do Líder, Mestre e Pensador Maubere pelos séculos fora.

Conheci NL, em 1962/63, no Seminário de Nossa Senhora de Fátima, em Dare. NL estava então a frequentar o 4o. Ano de Humanidades, mais adiantado que eu dois anos e tinha por colegas o meu saudoso irmão Afonso Redentor Araújo, Alberto Ricardo (falecido Bispo de Díli), Abel de Fátima, José Alexandre (Xanana) e Amaro Jordão de Araújo, entre outros. Já se destacara de entre os seus colegas de curso e no seu 5o. Ano foi nomeado Subprefeito, o braço direito do Padre Prefeito.

Nesse ano letivo de 1963/64, o termo Subprefeito foi substituído por Bedel, termo introduzido pelo então Reitor, o jesuíta espanhol, Pe. Andrés Rabago S.J. Recordo-me tão bem desse ano, eu estava no 3o. Ano. Chegou o Convite do Governador da Província de Timor para um Seminarista estar presente no Por-do-Sol, no Palácio de Lahane, Residência do Governador, juntamente com Altas Individualidades convidadas de entre as Autoridades Civis, Religiosas e Militares e no Jantar de Gala do dia 10 de Junho, dia de Portugal.

Durante cerca de duas semanas antes do dia 10 de Junho, Nicolau Lobato passou a jantar com os nossos Professores Jesuítas para se inteirar da comida portuguesa e das boas maneiras de se estar â mesa manuseando com correção quer os talheres de vários tipos – couvert, sopa, peixe, carne e sobremesa - bem como do uso dos copos ou taças de champagne, vinho branco, tinto, água e digestivos no acompanhamento do café. Era, de facto, um outro mundo o que nos circundava, um mundo do colonizador e um outro totalmente oposto, o do colonizado dos bairros pobres. Nós os seminaristas, vivíamos um mundo aparentemente à margem daqueles dois mundos, mas em relação à comida do dia a dia, com exceção dos Domingos em que nos era servido arroz, nos outros dias da semana satisfazíamo-nos com o batar dan – milho cozido – para o que precisávamos unicamente de um prato, colher e garfo.

No dia seguinte ao 10 de Junho, Nicolau voltou à rotina de sempre que era voltar a jantar connosco, os seus colegas seminaristas. Tinha-se saído bem no Palácio do Governador de Lahane à exceção de “uma pequena falha que praticamente não foi notada por que Nicolau soube corrigir imediatamente”, no comentário do nosso Pe. Reitor.

Terminadas as férias grandes regressámos ao Seminário para o início de outro ano letivo. Não me lembro do dia, mas recordo-me que após termos “todos” regressado, numa manhã, o Pe. Reitor foi à Sala de Estudos e perguntou-nos se tínhamos dado pela falta de alguém. Como habitualmente quando alguém deixava o Seminário, o Pe. Reitor ia anunciar-nos o acontecimento. O Nicolau já não estava connosco e não tinha sido chamado para o múnus sacerdotal, ou seja, “não tinha vocação para o sacerdócio”. Nicolau tinha concluído o 5o. Ano do Seminário que era equivalente ao 5o. Ano dos Liceus para fins de ingresso no Quadro do Funcionalismo Público.

Um ano mais tarde o mesmo viria a acontecer comigo. Reencontrei Nicolau no Curso Noturno do Liceu Dr. Francisco Machado. Em 1965-66 o tema das nossas conversas a dois era o grande movimento nacionalista na Indonésia liderado por Sukarno. Não fazíamos ideia da tentativa “esquerdista” da insurreição militar falhada e liderada pelo Coronel Untung de 30 de setembro de 1965 que levou ao Golpe de Suharto-Nasution contra o PKI – Partido Comunista Indonésio - e que levaria anos mais tarde ao derrube do Presidente Sukarno, líder carismático do PNI – Partido Nacionalista Indonésio.

Em 1969, deflagrou a grande “polémica do barlaque” que, por sua vez, deu início àquilo que eu gosto de chamar de “Renascimento Cultural em Timor”, do qual eu muito me orgulho de ter feito parte quando, nesse ano, passei a defender o barlaque/hafoli, não como o processo de compra/venda da mulher, mas como a união de duas grandes famílias do noivo e da noiva assente nos pilares do fetosan-umane como os fundamentos sobre os quais assentava a organização sociopolítica da sociedade timorense.

Nessa fase, o Nicolau e eu líamos obras como a Geografia da Fome, de Josué de Castro, um livro muito “subversivo”, como a PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) designava na altura – motivados pela nossa sede de conhecimento, um livro que expunha a pobreza que grassava no mundo em contraste com a riqueza das Metrópoles coloniais. Eu estava bastante arreigado à nossa tradição e à cultura timorense, quando, um dia, foi publicado um artigo escrito por Inácio de Moura, um Português radicado em Timor e que depois de cumprida a comissão militar tinha ingressado no Quadro Administrativo Ultramarino como Administrador de Posto. O artigo tinha por titulo “Mulher de lipa, Feto de Timor”.

Nessa época, eram publicados três jornais em Timor: A Voz de Timor, o jornal do Estado, da província ultramarina, A Seara, o jornal da diocese de Díli, e A Província de Timor, o jornal dos militares, do CTIT (Comando Territorial Independente de Timor).

O cabo miliciano Abílio de Araújo, meses depois Furriel Miliciano, reagiu de imediato contra este artigo, escrevendo uma Carta Aberta ao Senhor Inácio de Moura”, que acabou por ser publicada pelo jornal dos militares A Província de Timor (é curioso ter sido a tropa a dar-me cobertura, são as contradições do sistema, mas também a prova de que já naquele tempo havia gente muito aberta).

Defendi o casamento tradicional timorense, defendi a pureza do Barlaque/Hafoli e contra-ataquei naquilo que eu considerava ser o desprezo pelos valores da cultura timorense.

Jaime Neves, Solicitador, Vogal do Conselho do Governo, locutor e diretor da Radiodifusão de Timor e Diretor do jornal A Voz de Timor intromete-se e escreve: “NAO, ABILIO ARAUJO”. Com o intuito de me arrasar Jaime Neves alerta as autoridades de que eu alimentava ideias subversivas! Eu não podia aceitar que alguém, por desconhecimento, viesse pôr em causa os nossos valores culturais e nesse sentido exigi que houvesse respeito.

A minha resposta a Jaime Neves “ONDE ESTA’ A VERDADE? “teve de ser publicada ao longo de cinco edições do semanário A Província de Timor.

Nessa altura, eu já não dormia no quartel e, numa noite, ouvi aproximar-se uma motorizada que parou o motor ao pé da minha casa de palapa, em Karreta’At, Taibesse. Ouvi uns passos na minha direção e, quando cautelosamente fui ver quem era, deparei com o Nicolau Lobato, que entrou em minha casa com umas páginas datilografadas na mão e me disse:

– Abílio, eu também vou entrar na guerra.

Trazia um artigo que ia publicar n’A Seara tomando o meu partido e atacando o Jaime Neves. Volvida uma semana, o Borja da Costa – o nosso poeta nacional – foi também ter comigo e entrou na polémica.

Nesse momento, o Luís Filipe Ferreira dos Reis Thomaz – sobrinho-neto do então Presidente da República Portuguesa Almirante Américo Thomaz – que, nesse momento, era o Diretor d’A Província de Timor e me tinha dado cobertura em defesa da minha posição, publicou o artigo intitulado “Tréguas”, afirmando que iria mandar todos os nossos artigos para um professor de etnologia, antropologia, etnografia, para se pronunciar sobre o assunto.

Foi uma forma muito hábil de acabar com essa polémica, que tinha gerado em nós um certo desconforto e vontade de defender aquilo que é nosso. Hoje, na História de Timor, a célebre polémica do barlaque é um marco no despertar da consciência organizada daquela elite emergente que, mais tarde, iria fazer parte da liderança do movimento de libertação nacional de Timor.

Recordo Nicolau Lobato com muita saudade. Partilhei com ele muitas das preocupações da nossa Geração. Conversas que desaguavam em dúvidas metódicas e existenciais. Confidências que nos embalavam em sonhos de como construir o futuro do nosso Povo.

Nunca me esquecerei daquele abraço de despedida no aeroporto de Díli, atualmente zona do Palácio Presidencial, em outubro de 1971, antes de apanhar o avião bimotor para Baucau e depois Darwin, rumo a Lisboa. Eu, com os olhos marejados de lagrimas, ouvi-o sussurrar ao meu ouvido - “Abílio, o nosso Povo põe os olhos em ti, neste momento!”

Dois anos depois, em 1973, quando regressei de férias a Timor, voltámos a falar sobre Timor, os movimentos de Libertação em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique e a Frente anti-imperialista na Indochina.

Não me esquecerei nunca da Reunião da Proclamação da transformação da ASDT em FRETILIN, em 11 de Setembro de 1974, na residência do saudoso Proclamador Presidente Francisco Xavier do Amaral. Acabados de chegar de Portugal nesse mesmo dia, nós os Cinco Estudantes – Mau Lear, Sahe, Abílio Araújo, Seran e Guilhermina Araújo - fomos informados da nova sigla FRETILIN – Frente Revolucionária de Timor Leste Independente. Fui escolhido para fazer a intervenção como Ponto Prévio. Manifestei a nossa discordância em relação à sigla. Propusemos outra sigla FULIN – Frente Unida para a Libertação e Independência Nacional. Meses antes uma delegação da ASDT tinha ido a Kakuit, em Same/Manufahi visitar a Rainha, viúva de Dom Boaventura.

Este reconhecimento seria por nós assumido como a evidência de que as sementes da Resistência e Luta pela Liberdade já tinham sido lançadas â terra adubada pelo sangue dos nossos antepassados e, por isso, a nossa geração era a ESPIGA. A nossa geração era a CONTINUADORA da obra dos nossos maiores! Tínhamos proposto FRENTE UNIDA porque uma das causas das sucessivas derrotas dos nossos maiores tinha sido a nosso divisionismo e o nosso esforço seria o de congregar todas as forças anticolonialistas que se manifestaram contra a presença colonial portuguesa em Timor e que eram bem patentes quer na UDT quer na APODETI. Já trazíamos connosco o Programa Politico da FULIN.

Depois da minha intervenção, levantou-se Nicolau Lobato e disse que já era tarde. O Manifesto já tinha sido impresso na Tipografia, os Delegados Regionais já tinham regressado aos Concelhos, e o Programa Radiofónico HAKSOLOK dirigido pelo meu irmão Afonso já tinha sido gravado e iria para o ar nessa mesma noite. Por isso, nada se podia fazer pelo que aceitámos e declarámos estar prontos para juntos proclamar a FRETILIN.

Foi o que aconteceu.

Nicolau Lobato como homem de grande rigor matemático e pensador-filósofo assumiu ao longo da sua liderança um forte espirito de disciplina. Homem sem medo de tomar decisões sempre defendeu a versatilidade na tática e a firmeza na estratégia. De espírito aberto, foi um exímio promotor do diálogo e debate de ideias nas reuniões dos órgãos da FRETILIN e o respeito pelas decisões dos órgãos colegiais.

Generoso, Nicolau Lobato entregou-se de alma e corpo à causa do Povo. Para isso, abandonou em 1974 o seu emprego nos Serviços de Fazenda e Contabilidade. Grande mobilizador de massas e doutrinador possuía um vasto conhecimento da História de Resistência Anticolonial do nosso Povo.

Não me esqueço do nosso Comício em Maliana, em finais de 1974, a pedido do António Maria de Carvalho (exímio solista de viola) que na altura chefiava a nossa equipa de mobilização em Maliana. O terreno era-nos hostil e várias pessoas da UDT embriagadas se nos acercavam com provocações. Decidíramos avançar para o Campo de Futebol onde havia um grande ajuntamento. Mal o Nicolau iniciou o Discurso em tom de oratória em que ele era exímio, choveram sobre nós pedras e reluziram catanas desembainhadas em gritos de Guerra Haklalas orquestradas pelos opositores da UDT. Ainda assim, Nicolau continuou a descrever o heroísmo das gentes de Cova e Cotubaba, Suai/Camenasse, Saniri e Cailaco nas suas revoltas de um passado não muito remoto… até que nos decidimos a sair do local e recuar subindo as montanhas até Bobonaro. O Presidente Xavier do Amaral decidiu naquela tarde mesmo retornar à capital. Para Bobonaro seguimos Nicolau Lobato, Carvarino (Lear), Vicente Reis (Sahe), Venâncio Gomes (Seran), Guilhermina, Luís Mendonça de Maubisse e eu. Dormíamos nas casas das populações que nos davam comida e dormida enquanto íamos explicando a situação politica, o Manual Politico da FRETILIN e Programa Politico. Os diálogos continuavam pela noite dentro. Incansável como sempre o Nicolau transmitia-nos pelo seu magnetismo invisível a confiança no Futuro da nossa Terra. Como nos sentíamos deslumbrados pelo acolhimento, pelos participantes, da nossa Mensagem esperada no recôndito dos corações do nosso Povo por vários seculos!!! Ao terceiro dia, fomos surpreendidos por um Pelotão do Esquadrão de Cavalaria de Bobonaro que nos prendeu a todos e nos conduziu ao Comandante Major Falcão. Nicolau assumiu a defesa da FRETILIN e respondeu contra-atacando todos os argumentos invocados. A FRETILIN estava no seu direito de promover o seu Ideário Politico no âmbito do Programa do MFA – Movimento das Forcas Armadas - dos 3 Ds, Descolonizar, Democratizar e Desenvolver. Pernoitámos no Quartel e no dia seguinte fomos forçados a deixar Bobonaro e escoltados por dois soldados de 2a. Linha como se fossemos criminosos. Durante a viagem de Bobonaro a Díli fomos conversando com os dois guardas, nossos compatriotas encarregues de nos entregarem no Comando da Policia, em Díli. Mas quando ali chegámos, já noite, os dois guardas mandaram-nos para a casa sem quererem saber que tínhamos pendente sobre nós um Julgamento Sumário no Tribunal da Comarca de Díli. No dia seguinte, fomos chamados pela Policia para comparecermos no Tribunal, edifício do atual Museu da Resistência porque o Juiz, o Delegado do Procurador e o Escrivão já estavam à nossa espera para o Julgamento. Nicolau mostrava-se calmo e Xavier do Amaral apresentou-se como testemunha. Em nossa defesa Nicolau Lobato questionou a acusação baseada nas “leis colonial-fascistas”, suporte do regime deposto pela Revolução dos Cravos, de 25 de Abril. Uma autodefesa brilhante que não precisou de nenhum advogado certificado. No largo fronteiriço ao edifício do Tribunal uma grande multidão estava concentrada, desde manhã cedo porque já não cabia na Sala de audiências. Ouviam-se vozes que clamavam, manifestando-se prontas a irem encher as prisões caso fossemos condenados. No fim foi o próprio Delegado do Procurador Geral da Republica quem pediu ao Juiz a aplicação de “pena suspensa” por um ano. Uma vez mais Nicolau Lobato se afirmou como Líder. Fomos todos vitoriados pelas massas populares que só não levaram em ombros Nicolau Lobato “porque a FRETILIN era contra o culto da personalidade”.

Ávido do saber que sempre procurou através do estudo persistente das obras de pensadores, filósofos e combatentes nacionalistas do Terceiro Mundo também se viu confrontado por dúvidas e interrogações que assaltavam a sua Fé. Um dia, em Lisboa em maio de 1975, Nicolau perguntou-me de chofre: “Abílio, como resolveste o teu problema de Deus?” Nesse instante tive o pressentimento de que no seu intimo ele debatia-se entre a Teologia -, estudo de Deus na base da Fé - e a Teodiceia, estudo de Deus pela Razão. Respondi-lhe: “Eu não tenho nenhum problema com Deus”!

Homem de profundas convicções e retidão de caráter assumiu o combate libertador até às últimas consequências.

Sendo um dos companheiros de Nicolau Lobato da chamada “Geração de 1974-75”, presto homenagem ao esforço aturado, persistente e incansável do Rev. DR. Pe. Martinho Gusmão assim como a todos os que o apoiaram direta ou indiretamente na pesquisa e compilação dos textos de Nicolau Lobato que ora vêm a lume. Partilhámos horas sem fim opiniões e interpretações sobre os escritos de Nicolau Lobato e através deles sobre a personalidade de Nicolau Lobato. Maubere, por excelência, Nicolau Lobato via no âmago das manifestações do nosso Povo uma identidade forte que resistiu aos séculos da dominação colonial portuguesa. Nicolau Lobato não pôde ver e sentir a transformação ocorrida no tecido social Maubere, como resultado da violência, genocídio físico e aniquilamento seletivo, de uma elite portadora dos valores e cultura mauberes, perpetrados durante os 24 anos de ocupação Indonésia. Por conseguinte, os escritos de Nicolau Lobato continuam atuais e merecem ser estudados e assimilados pelas gerações presentes e futuras!

Seja esta Obra um contributo para uma Psicanálise (Catarse?) Coletiva do estado social e espiritual a que chegámos e, uma ocasião para, neste Quadragésimo Aniversario da morte de Nicolau Lobato, augurar um renascimento em todos nós dos Valores proclamados por Nicolau Lobato que, sem dúvida alguma, se tornaram deficitários no seio da sociedade timorense.

Os povos têm nos seus heróis o cimento agregador do seu orgulho nacional. Reveem-se e buscam inspiração no exemplo das suas vidas abnegadas e corajosas. São os seus modelos de proximidade que também cresceram a sentir o inebriante perfume das flores do café e a extasiar-se perante a extraordinária beleza das acácias floridas. O nosso desejo é que esta obra biográfica sobre Nicolau Lobato seja não só uma revelação, mas uma fonte inspiradora capaz de

motivar intelectuais, professores, “scholars” e estudantes a realizarem Teses de Mestrado e Doutoramento sobre a vida e obra de Nicolau Lobato e de tantos outros heróis de referência. Representará uma imensa homenagem aos heróis. Será sobretudo mais uma via para consolidar os fundamentos e os valores da Pátria que eles sonharam e que todos nós queremos imortal.

Abilio Araujo
Dato Siri Loe II
Kaduna, Asuinus, Tibar, 22 de Junho de 2018

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