Panorama
atual da política em Timor-Leste:
Eleição
Parlamentar de 2017.
Por Afmend Sarmento
Afmend Sarmento |
Foi
decretada por Sua Excelência o Presidente da República sessante Taur Matan
Ruak, a data da Eleição Parlamentar para o dia 22 de julho de 2017. Felizmente
já estamos na época da Campanha Eleitoral – é o momento para divulgar os
programas eleitorais, as promessas políticas, com intuito de mobilizar e
conquistar o eleitorado para eleger os partidos políticos, que irão governar o
povo e a nação nos próximos cinco anos. É uma data áurea, um clima que indica o momento de glória e da tão almejada
vitória de uma espécie de predestinado,
que irá ocupar o cargo do Presidente do Parlamento Nacional e Chefe do Governo
do VII Governo Constituicional.
A eleição é o momento em que se reconheça teórica ou praticamente ao
povo o direito de participar na gestão do poder político
através do seu voto. Assim,
segundo os dados do Tribunal de Recurso, nesta festa de democracia, são 21
partidos concorrentes legítimos a competir no “mercado” político,
designadamente, BUP, APMT, KHUNTO, PEP, PST, PDP, CNRT, PR, UDT, PDC, MLPM,
PLP, PD, UNDERTIM, PUDD, PTD, FRENTI-MUDANSA, PSD, PDN, CASDT, FRETILIN.
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Neste
sentido, podemos mesmo definir qual é a “personagem” política se posicionará
adequadamente no cenário vigente? O cenário político mostra claramente uma luta
entre as ideologias políticas e uma ganância de manter o status quo, na condução deste país. Podemos observar que esta festa
de democracia é muito competitiva. No palco político, os três ilustres do país,
nomeadamente, Xanana Gusmão, Marí
Alkatiri e Taur Matan Ruak, vão “vender”
as suas promessas políticas, os seus progamas eleitorais. Entre eles, duas
figuras vão procurar todos os meios estratégicos para manter o “status quo”, na roda de governação,
enquanto, outra figura vai competir, de forma a ganhar a confiança do povo.
Na realidade,
consta-se que nos últimos anos, um fenómeno denominado, “confidence gap” (falta de confiança) corrompeu o apoio dos cidadãos
à governação de Xanana e do Presidente de RAEOA, Marí Alkatiri. Assim, a figura
de XG e MA tornam-se, o que o filósofo Charles Taylor distingue como «marés altas» (ref. TAYLOR, Charles, 2012, 253), isto é, o fervor da população em aclamar
Xanana como grande herói e, conseguentemente, em 2002 Fretilin ganhou a eleição com maioria
absoluta, mas após uma década de fluxo intenso começou a diminuir (2007 e 2012:
ganharam com maioria simples). Esta confidence
gap mostra claramente na pesquisa realizada pelo International Republican Institute (IRI), ao
concluirem que um maior número da população timorense não aderirem a qualquer
partido político e com um volume elevado dos indecisos em escolher um partido
na próxima eleição. Na verdade, há uma certa “reacção de fadiga” e “perda de simpatia” da população
timorense, porque os políticos não cumprem a promessa do princípio de
reciprocidade - do ut des - isto é, o
povo oferece o seu voto, enquanto o político cria as condições laborais para o bem-estar
do seu povo.
Olhando
retrospectivamente para o desenvolvimento do País, nestes 15 anos da
Independência, podemos constatar que, curiosamente, o panorama do
desenvolvimento sociopolítico dos sonhos dos founding fathers em criar condições necessárias para o summum bonum e bonum commune dos timorenses, é apenas uma utopia. O povo Mau-bere - só para um exemplo - pode ter orgulho de
pertencer a um país independente, porém, consta-se que “a new imperial age” (o neo-colonialismo) nomeadamente da Indonésia
e China, vem acontecendo fortemente em Timor-Leste. Este acontece numa esfera
muito soft, isto é, através do domínio
dos mercados timorenses. De facto, Timor-Leste é o terreno mais fértil para os
negociantes internacionais e torna-se «a caixote do lixo internacional»
(Muhammad YUNUS), desde os negociantes até aos produtos consumidos. Observa-se in loco, verificamos que são incontáveis
as lojas de origem Indonésia e os zing
zang espalham-se até as aldeias
remotas. Os timorenses tornam-se espectadores na sua própria terra, como bem
enfatiza por Xanana: “Hudi laran sai China laran”. Um fenómeno extraordinário
aconteceu, na primeira consolidação do Movimento Camponeses Timor-Leste
(MOKATIL), Xanana chorou ao ver a
situação precária/miserável enfrentada pelos camponeses. Depois de dez anos
governar o país, na véspera de campanha eleitoral, chorou perante os
camponeses. São as lágrimas de misericórdia ou o choro por votos na eleição do
dia 22 de julho?
Num
país democrático como o caso de Timor-Leste, o que gera e mantém organizadas as
sociedades é a Política. O uso atual da palavra política deriva de Πολιτική (politike), do grego, e diz respeito
àquilo que é da cidade, da pólis (na
Grécia Antiga), da sociedade, ou seja, que é de interesse do homem enquanto
cidadão (ref. Norberto Bobbio, 1998, 954). Intrinsecamente, é uma busca
constante do bem comum de uma sociedade, como bem observa o Papa Francisco “a
política, tão denegrida, é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas
da caridade, porque busca o bem comum” (Evangelii
Gaudium, 205). A Política é, no
fundo, um conjunto das atividades-acções ou um instrumento precioso que visa a estruturar-organizar
e, por fim governar por um período determinado a uma sociedade de um país.
Desde
as primeiras tentativas à elaboração de teorias da política, arraigadas na Democracia
Ateniense, o homem pelo uso da razão, tem desenvolvido as regras para a
vida na pólis, ou seja, na sociedade
da qual faz parte. Para Aristóteles, o homem é um animal político (ref. A
Política. p. 53). Por política, ele entendia a vida na pólis, a vida comunitária na cidade. O fim teleológico da política
é para alcançar o summum bonum e bonum commune. Norberto Bobbio justifica
que não se pode resumir a finalidade ou o fim da política a um aspecto, pois
“[...] os fins da política são tantos quantas forem as metas a que um grupo
organizado se propõe, segundo os tempos e as circunstâncias” (ref. Norberto Bobbio,
1998, 167). Entende-se que, por um lado,
uma das características essencial da noção de política é concebida como um espaço de disputa pelo poder à atividade
político-partidária que tem como objetivo de
ocupar os cargos políticos, no âmbito dos poderes legislativo e
executivo. Por outo lado, não podemos cair, facilmente, na redução do conceito
de política ao aspecto de luta pelo poder, porém, “é uma das formas mais
preciosas da caridade, porque busca o bem comum” (Papa Francisco), ou seja, a
racionalização da praxis
governamental no exercício da soberania política. Por isso, é importante se
afirmar que o poder político não tem de conceber com a finalidade, puramente, o
poder pelo poder, pois se assim fosse perderia o sentido e signaficado como praxis humana, que visa o Bem Comum.
A noção
política dos timorenses é o espaço institucionalizado da disputa pelo poder. Como
bem dito Max Weber que todo o homem que envolve na política – está
intrinsecamente- aspira ao poder (ref. Max Weber, 2011, 59). Esta concepção
weberiana está relativamente influenciada as concepções mais usuais de política
na sociedade timorense. Estes animal
politicus farão qualquer apelo a uma transformação radical da sociedade —
e, portanto, como possíveis detentores do poder político. Um politólogo vê na
política como um campo fértil para obter benefícios-lucros, principalmente para
beneficiar a maldita Pensão Vitalícia
que, é transformada numa fonte permanente de lucro (ref. Sygmunt Bauman, 2010,
13) para os eis titulares.
Podemos
dizer sine ira et studio (sem
ressentimentos nem preconceitos) que há sinais positivos de mudança nesta
década de “Ukun Rasik-an”, por exemplo, a maioria da população timorense tem
acesso a eletricidade. Porém, sinceramente, também se pode afirmar que “há mais
política” do que o desenvolvimento nacional. Aqui, notamos claramente, que os “founding fathers” são mais homo politicus do que homo technicus, na construção deste
jovem país. Não seguindo o instinto racional de conduzir o país à meta política
para alcançar o bem supremo (bonum
commune) que é próprio à cidade. Como enfatiza Max Weber: «o homem político
deve dedicar-se ao serviço de fins nacionais ou humanitários, sociais, éticos
ou culturais... » (ref. Max Weber, 2011, 108), mas constata-se que se privilegia o interesse pessoal e partidário,
mais do que o interesse nacional.
Guiando
pelo artigo 6º da Constituição sobre Objetivos do Estado, alineia (e) frisa que o Estado deve “promover
a edificação de uma sociedade com base na justiça social...” (C-RDTL, 6). No
entanto, práticamente ainda não foi implementada a política de edificar a
justiça social. Na verdade, este povo sente-se ferido com a injustiça social
praticada pelas elites políticas. Convertendo-se numa política de vita mea é mors tua
(ref. Norberto BOBBIO, 2000, 171),
isto é, as elites políticas perseguem o sentido da existência em direção às
próprias sensações de bem-estar,
enquanto o povo vive num oceano de miséria.
Infelizmente,
na aprovação dos vários Orçamentos
Gerais do Estado, com grandes quantias de doláres (8 bilhões), nestes 15 anos,
mas o povo ainda vive no limiar da pobreza. Ora, actualmente em Timor verifica-se um duplo
fenómeno: (1) uma desigualdade ao nível económico: há ricos e
pobres. A gravidade de tal situação está no facto de que os ricos se tornarem
cada vez mais ricos à custa dos pobres; (2) uma desigualdade ao nível social,
isto é, a má distribuição dos bens da nação - o Oecusse foi abenciado com ZEESM,
enquanto outros municípios tornam-se o espetáculo do desenvolvimento, vivem miseravelmente
com o clamor “...neste
vale de lágrimas!”. O fenómeno “século do dinheiro” denominado por
Thomas Moore, onde “neste século de dinheiro, o dinheiro é o deus e a medida
universal” (Thomas Moore, 2001, 28), favorece nesta sociedade fragmentada e
heterogénea uma grande discriminação social. No meio da pobreza, criar-se-ão mega
projecto de ZEESM e Tasi Mane, edifícios luxuosos como o Ministério das
Finanças, que servem para mostrar “como é que algumas pessoas podiam viver
rodeadas de tanto luxo, enquanto milhares de pessoas enfrentavam a miséria, a
privação e o desespero” (ref. Muhammad Yunus, 2008, 299). Os timorenses têm que
partilhar equitativamente a honra e o ónus da nação sem excluir nem privilegiar
ninguém. E que esta pátria possa ser domus fraternitas para todos os timorenses.
Em suma, verificamos, claramente, o duplo movimento político de Max Weber: “ou
se vive para a política ou se vive da política”( Max Weber, 2011, 64), isto
é, por um lado, quem vive “para” a
política transforma a pólis,
colocando o interesse nacional como ordem sacra: “Ha’u nia dignidade la aas liu
Nasaun nia dignidade”, para citar o Saudoso Lasama. Por outro lado, quem vive “da” política procura primeiro o seu
interesse pessoal ou partidário. Caindo no jogo de palavras de filiação, isto é, quando se refere ao
familiarismo e afiliação indica ao
partidarismo. Assim, o fim da política não é para alcançar o Bem Comum, mas o
bem da família e do partido. A nação –
para estes animal politicus –
torna-se a segunda opção, dada a importância à primeira opção que é a familia e
o partido.
Neste contexto,
estes futuros governantes possam assumir de forma coerente os três eixos
fundamentais do homem político: «paixão, sentimento de responsabilidade, senso
de proporção», isto é, a “paixão” no
sentido do “propósito de realizar ” algo para transformar a pólis; para que isso aconteça, é
necessário o “sentimento de
responsabilidade” e que se torne a
estrela polar de uma actividade ou de um projecto; finalmente, o “senso de proporção” como uma qualidade
psicológica fundamental de um homo
politicus. E, é necessário combater um grande inimigo comum de todo o ser
humano, que é a «vaidade» (ref. Max Weber, 2011, 106).
Todos
nós esperamos que, esta Eleição Parlamentar, possa surgir uma figura política,
que é capaz de fazer política com a sabedoria do coração (sapientia cordis) e da mente (paixão
e compaixão), seguindo a ética
agostiniana: ama, et quod vis fac
(ama e faz o que quiseres), com intuito de transformar a pólis. Estamos conscientes de que o VII Governo Constitucional não
pode fazer milagres nos seus
mandatos, mas que se procederão a algumas transformações, para o bem-estar da
nação e deste povo.
Em
suma, na vida da Pólis idealizada na Democracia Ateniense, em caso de
conflito de interesses, o interesse do bem comum prevaleceria sobre o bem do
indivíduo e partidário, pelo contrário, na sociedade timorense o bem do indivíduo
e partidário têm a supremacia. Óxala, que a ênfase da política do VII Governo
Constitucional mudará, prioritizando o interesse nacional como uma ordem sacra para todos os políticos.
Deixem para trás os interesses partidários e familiares. Sim, “a luta contínua
para a causa do desenvolvimento nacional” (Rui Maria de Araújo). Se olharmos
para os líderes máximos da geração de 75 como "founding fathers", então devemos chamar a geração de Santa
Cruz como "Fathers of development".
Enquanto, a geração de 75 sacrificou a
sua vida para libertar a Pátria. É o
tempo e a hora exacta para que a geração de Santa Cruz possa libertar o povo da
pobreza e da miséria.
(Este artigo
representa opinião pessoal do jovem da aldeia remota; aldeia: Casamou; Suco:
Seloi Craic; Município: Aileu)
Bibliografia:
- ARISTÓTELES, A Política. Tradução de Roberto Leal Ferreira, Martins Fontes, São Paulo 2002.
- BAUMAN, Sygmunt, Capitalismo parasitário, Zahar, Rio de Janeiro 2010
- BOBBIO, Norberto, Teoria Geral da Política, 14ª edição, Editora Campus, Rio de Janeiro 2000.
- __________________, Dicionário de Política I, Editora Universidade de Brasília, 11ª ed., 1998.
- CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE.
- MOORE, Thomas, Utopia, in file:///C|/site/LivrosGrátis/utopia.htm (1 of 62) [05/04/2001 17:09:01].
- TAYLOR, Charles, A Era Secular, Instituto Piaget, Lisboa 2012.
- YUNUS, Muhammad, Criar um mundo sem pobreza, Editorial Difel – Medialivros, Lisboa 2008.
- WEBER, Max, Ciência e Política – duas vocações, 18ª edi., Editora Nova Cultural, São Paulo 2011.
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