Quase três anos depois de ter sido anunciado pelo antigo primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, está já disponível a primeira tranche do Fundo da Cooperação para o Desenvolvimento entre a China e os Países de Língua Portuguesa. São 125 milhões de dólares americanos (quase de mil milhões de patacas) para financiar investimentos de empresas chinesas e do universo lusófono.
Pedro Galinha
O anúncio foi feito ontem, mas o Fundo da Cooperação para o Desenvolvimento entre a China e os Países de Língua Portuguesa foi criado oficialmente na quarta-feira, lia-se no comunicado da Direcção dos Serviços de Economia. Ou seja, quase três anos depois de ter sido apregoado, em Novembro de 2010, pelo então primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, na 3ª Conferência Ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum Macau).
O valor global deste fundo é de mil milhões de dólares americanos, mas a primeira tranche está fixada em 125 milhões de dólares americanos. As entidades responsáveis pelo financiamento desta iniciativa, promovida pelo Governo Central, são o Banco de Desenvolvimento da China e o Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização de Macau.
“É melhor tarde que nunca”, começa por dizer o presidente da Associação Comercial Internacional para os Mercados Lusófonos (ACIML), Eduardo Ambrósio, antes de revelar que, “até agora, os empresários não têm conhecimento sobre quais são os trâmites e procedimentos para pedir apoio do fundo”.
“Não temos qualquer informação”, insiste o dirigente da ACIML.
“Já pedimos algumas vezes, mas disseram sempre que a resposta viria em breve. Não temos nada na mão, mas, de qualquer maneira, é uma boa notícia e, assim que tivermos mais tempo, vamos ter uma reunião com os nossos associados para discutir como podemos aproveitar este fundo e expandir as nossas oportunidades de negócios”, afirma Eduardo Ambrósio.
O PONTO FINAL contactou o secretário-geral do Fórum Macau, Chang Hexi, que prometeu prestar todos os esclarecimentos sobre o fundo depois do “IX Encontro de Empresários para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e Países de Língua Portuguesa”. A reunião terá lugar em Díli (Timor-Leste), entre 1 e 3 de Julho, e conta com uma apresentação feita pelo Banco de Desenvolvimento da China no programa.
Áreas bem definidas
“O fundo concentrar-se-á nas necessidades de investimento e financiamento das empresas do Interior da China (incluindo Macau) e dos países de língua portuguesa”, precisava o comunicado da Direcção dos Serviços de Economia, que acrescentava que a sua constituição serve ainda para “promover a construção de infra-estruturas, transportes, telecomunicações, energia, agricultura e recursos naturais”.
Carmen Amado Mendes defende que a definição destas áreas de investimento revela “de forma transparente” os “interesses económicos e comerciais subjacentes à criação do Fórum Macau”. Mas a investigadora da Universidade Coimbra, que tem realizado vários estudos sobre esta plataforma multilateral, alerta para o facto de “o peso que cada uma destas áreas tem em cada um dos países de língua portuguesa varia”.
“Por exemplo, em Angola, o interesse na construção de infra-estruturas por empresas e trabalhadores chineses é particularmente evidente, a par da importação de petróleo, numa lógica conhecida por ‘Resources for Infrastructure’. No Brasil, o envolvimento nas infra-estruturas não é tão visível e está geralmente confinado à área de exploração e transporte de recursos naturais. A importação de petróleo, minério de ferro e soja domina a balança comercial”, nota Carmen Amado Mendes.
Em Portugal, o investimento chinês na EDP e REN são “uma história bem conhecida”. Já em Timor-Leste, chegou à rede de distribuição eléctrica nacional, “pelas montanhas mais recônditas”, e o petróleo “também tem um peso importante na equação”.
A aposta no sector agrícola é outra face visível da relação comercial e económica entre a China e o mundo lusófono. “O investimento chinês na agricultura é crescente em muitos destes países, nomeadamente Moçambique, e o peixe da Guiné tem características de grande atractividade para os chineses. Guiné e Moçambique são também países que têm exportado muita madeira (não transformada) de todas as qualidades para a China”, aponta a académica.
“Em suma, não espanta que o fundo se concentre em apoiar as áreas de principal interesse chinês nos restantes países do Fórum Macau. Este fundo vai, assim, facilitar o investimento nessas áreas e, embora teoricamente funcione também no sentido contrário, ou seja, para apoiar o desenvolvimento das empresas desses países na China, o grande objectivo é reforçar a presença chinesa no mundo lusófono com um instrumento que tornará as empresas chinesas ainda mais competitivas, para desespero das outras dos países membros do Fórum Macau, nomeadamente portuguesas e brasileiras”, conclui Carmen Amado Mendes.
O comércio entre a China e os países de língua portuguesa atingiu 523 milhões de patacas, em 2012. De acordo com o comunicado de ontem da Direcção dos Serviços de Economia, a constituição e o funcionamento do fundo agora desbloqueado, “alarga o espaço da cooperação económica e comercial” entre os actores da relação sino-lusófona, sem esquecer as oportunidades para Macau.
Pedro Galinha
Fundo desbloqueado
Opiniao: www.pontofinalmacau.wordpress.com
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