TIMOR-LESTE E A QUESTÃO DOS INVESTIMENTOS
)* Por Hercus Pereira dos Santos
Perguntaram-me alguns conhecidos portugueses como é que Timor-Leste, um país pobre, pode comprar a dívida portuguesa? Ou outra pergunta, Timor-Leste tem dinheiro?
Pois, estas e outras perguntas são questões válidas e qualquer pessoa que conhece a realidade timorense fica intrigada quando ouve o antigo Presidente de Timor-Leste Dr. Ramos Horta a dizer que Timor-Leste está disponível para comprar a dívida soberana de Portugal. O antigo presidente de Timor-Leste referiu ainda que esta é também uma forma de ajudar Portugal a sair da crise financeira em que se encontra. Para isso ele tentou definir um modelo de ajuda a Portugal, o qual deve integrar também outros dois países da CPLP, o Brasil e Angola.
Para mim, num primeiro momento, esta ideia deixou-me também assustado, pois compartilhei a mesma questão inicial: como é possível Timor-Leste poder comprar a dívida portuguesa enquanto em ainda prevalece em todos os cantos do território uma extrema pobreza? Há muitas famílias em Timor-Leste cujo rendimento mensal é menos de 10 euros. A diferença do salário mínimo entre Portugal e em Timor-Leste é muito grande. Em Portugal é 475 euros por mês enquanto em Timor-Leste é 115 dólar americano ou equivale aos 93 euros por mês. Em Timor-Leste há falta quase de tudo, desde recursos e meios para satisfazer as necessidades básicas da população, até as infra-estruturas públicas para prestar assistência ao nível da saúde, educação e providência social. Portanto, tudo precisa ainda de ser reformado e reconstruído. O país precisa ainda de reconstruir as suas estruturas administrativas e de desenvolvimento que foram destruídas por causa da frustração dos apoiantes da Indonésia. Face a esta realidade de reconstrução e de reorganização das principais estruturas do Estado e da economia nacional, como é que Timor-Leste pode querer comprar a dívida portuguesa?
Passando alguns momentos, tentei pensar e analisar esta questão um pouco para além dos meus pensamentos leigos e, reflectindo com maior acuidade, encontrei uma política inteligente do nosso prémio Nobel da Paz, como irei tentar descrever a seguir.
Como um estado novo, Timor-Leste precisa de ter e assegurar algo que possa contribuir para a sua viabilidade como um estado no mundo. Como todos nós sabemos muito bem que hoje em dia um estado não basta ter a sua soberania territorial, a sua soberania dos seus órgãos estaduais e o seu povo.
Antigamente o conceito de formação do Estado era muito restrito e tinha toda a razão lógica de o ser. Um Estado deve ter soberania, território e povo. Mas como a vida do ser humano é uma vida dinâmica e tudo evolui com o tempo e tudo existe no seu tempo, chegamos no momento em que alguns países deixam um pouco da sua soberania para ter algo mais. Por exemplo, como no caso de União Europeia, os estados membros, em alguns casos, compartilham a sua soberania, algo que não existia antes. O que é algo mais no meu entender? Pois, como um simples estudante, o que eu vejo, uma das questões importantes é a questão económica. Ou seja, através dessa união, cada estado-membro procura desenvolver o seu crescimento económico, além das outras questões importantes como segurança, a educação e cultura, por exemplo.
Por outro lado, o país precisa de ter mecanismos de política externa que apoiem o seu desenvolvimento e o seu crescimento, em cooperação com outros Estados. A integração regional e continental de uma país permite quebrar o isolamento de outrora e, sobretudo, permite projetar um Estado a nível mundial através da sua atuação no mercado global.
Portanto, a cooperação económica, social, política e cultural entre Timor-Leste e Portugal é favorável e representa uma visão estratégica de futuro dos líderes timorenses que tem como objetivo projetar o Timor como um Estado em reconstrução que possui uma economia emergente.
Nesse sentido, o que vejo em relação à ideia de comprar a dívida soberana de Portugal, do antigo Presidente de Timor-Leste, é uma questão económica. Ou seja, o propósito desta ideia é que Timor-Leste se possa tornar um Estado forte economicamente no futuro, pois a viabilidade de um Estado hoje em dia, além de assegurar estes três principais requisitos acima mencionados, passa também por assegurar o desenvolvimento económico sem diminuir a importância da sua segurança interna e externa (estes dois assuntos tratarei mais tarde numa outra ocasião relevante).
O que o antigo Presidente de Timor-Leste está a fazer é assegurar a viabilidade do Estado timorense economicamente sem, no entanto, diminuir estes dois aspectos: a segurança interna e externa. Os indonésios e os timorenses integracionistas defendiam, ainda no tempo da ocupação da Indonésia – alguns deles escreveram artigos de opinião e outros escreveram teses de doutoramento – que Timor-Leste não tinha viabilidade económica para ser um país independente. Se essa tese fosse verdadeira, seria uma perda para nós pró-independentistas. Contudo, o Dr. Ramos Horta e outros estadistas timorenses estão a tentar fazer uma antítese, de forma a assegurar eficazmente o fundo petrolífero através dos investimentos, não só no curto e médio prazos, mas também a longo prazo e, assim, possa beneficiar também as gerações vindouras.
A reformulação e a solidificação da economia de Timor-Leste devem passar também, sem dúvida, pelos investimentos económicos fora do país, bem como a atracão de investimentos estrangeiros dentro do país. Timor-Leste, com o pouco que tem, precisa também de potenciar todas as possibilidades e oportunidades de investimento fora do país.
Para atrair investimentos estrangeiros para em Timor-Leste, o Governo timorense está de portas abertas para os investidores internacionais. Em Timor-Leste falta ainda quase tudo e isso é uma realidade que não se pode negar, nem ocultar. Foi neste sentido que o país criou uma Lei de investimentos com o objetivo de garantir maiores retornos para as empresas internacionais. E neste esforço, além das várias empresas internacionais, o governo timorense está a tentar atrair o investimento específico de empresas portuguesas, ao nível da produção de bens e serviços que permitam a dar resposta às necessidades do país.
Para isso que, como diz o Ministro da Economia de Timor-Leste Dr. João Gonçalves numa entrevista ao jornal Público com data 21-05-2012, que o Governo tem tentando promover o potencial de Timor-Leste e as oportunidades de negócios que o país pode oferecer aos investidores, nomeadamente por incentivos que através da Lei Investimentos Timor-Leste concede aos seus investidores.
Em relação aos investimentos fora do país, Timor-Leste através do seu fundo petrolífero está a investir em promissórias do tesouro americano e nas dívidas soberanas australiana, grega e italiana. Para ter maior diversificação do seu fundo petrolífero o Estado timorense também fez a revisão da Lei de Investimentos anterior, de 2005. Esta Lei não permitia grandes diversificações, porque 90 por cento do fundo petrolífero obrigatoriamente teria de ser investido em títulos do tesouro norte-americano. A nova Lei, de 2011, veio a permitir uma maior diversificação dos investimentos do Estado timorense em 50 por cento do fundo petrolífero.
Segundo o Portal Oficial do Governo timorense, Timor-Leste está a investir o seu fundo petrolífero em 1800 empresas em 23 países desenvolvidos. O retorno deste esforço, isto é, o saldo do Fundo Petrolífero em Fevereiro de 2012 já atingiu 9,9 mil milhões de dólares. Além desses investimentos, o estado timorense ainda continua a procurar novas possibilidades no mundo dos negócios. O que importante para o Estado timorense é assegurar mais e maiores rendimentos para a estrutura do Estado que serão depois canalizados para a reconstrução e o desenvolvimento do país. Por isso, para o Estado timorense a compra de títulos da dívida soberana de Portugal, ou de dividendos de empresas como a EDP ou Galp Energia, é uma boa escolha pelos motivos que apresentei.
Timor-Leste mostra claramente essa vontade. Da outra parte, Portugal através do seu Presidente da República, o Professor Doutor Aníbal Cavaco Silva, numa declaração diplomática e com um sentido de profunda fraternidade demonstrou perceber muito bem a pobreza extrema e o sofrimento do povo de Timor-Leste e referiu que Portugal não nega essa possibilidade sobretudo se os timorenses entendem que isso é uma boa decisão para o país.
Esta declaração revela ainda que existe entre os governantes timorenses e os governantes portugueses uma unanimidade de pensamentos para que o fundo petrolífero seja utilizado para o bem do povo timorense. Por isso o que os governantes timorenses estão a fazer é a tentar procurar a melhor forma para tornar Timor-Leste um país viável, não só pela questão política e cultural, mas também pela forma de sobreviver economicamente no percurso da sua vida como um Estado novo através dos investimentos dentro e fora do país.
)* Estudante da Escola de Direito da Universidade do Minho
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