Aproveito o
nascer do sol em Timor-Leste, pois lá, já é de dia, para partilhar este pequeno
artigo sobre a vida de Dom Ximenes em homenagem ao seu 25º Aniversário de
Ordenação Episcopal.
Parabéns e OBRIGADO
Dom Carlos Filipe Ximenes
Belo, SDB.
Bispo Carlos Filipe
Ximenes Belo, SDB
19 Junho 1988 – 25º Aniversário de Ordenação
Episcopal – 19 Junho 2013
Há 25 anos atrás foi consagrado o primeiro bispo
timorense, o padre Carlos Filipe Ximenes Belo. A cerimónia da Ordenação
inserida na Eucaristia, diante da imagem da Imaculada Conceição em Lecidere,
foi fervorosamente participada por milhares de timorenses. Para muitos deles,
era a primeira vez que assistiam à consagração de um bispo. O bispo ordenante
foi o Núncio Apostólico em Jacarta, Mons. Francesco Canalini. Na cerimónia
estiveram também presentes oito Bispos provenientes de várias dioceses da
Indonésia. É de mencionar que a ordenação deste sacerdote deu-se no Ano Mariano
(1987-1988) e no ano do centenário da morte de Dom Bosco (1988).
D. Carlos Filipe Ximenes Belo - Amo Bispo como era
popularmente conhecido - já vinha servindo a Diocese de Dili como Administrador
Apostólico desde 12 de Maio de 1983, na altura apenas com 35 anos de idade
(portanto, o bispo mais novo do mundo) e novel sacerdote (ordenado em Julho
1980). Embora “sem conhecimentos pastorais”, parecia “ mais tolerante ” que o
seu predecessor, Dom Martinho da Costa Lopes. Perante o “não” e o “sim” de
muitas vozes sobre a escolha deste candidato para ser o pastor da igreja local,
o Santo Padre João Paulo II teria dito “e quello” acerca deste pastor “tímido”,
como alguns o queriam denominar.
MENINICE
Carlos Filipe é o quinto filho de Domingos Vaz
Filipe e Ermelinda Baptista Filipe. Nasceu em Wailacama, a 3 de Fevereiro de
1948. Domingos tinha sido professor primário e lecionava também em Lautém,
antes da 2ª Guerra Mundial. Após a guerra, muitos dos seus alunos tornavam-se
liurai (chefes) de muitos sucos e outros, funcionários públicos. O pequeno
Carlos perdeu o seu pai apenas com dois anos de idade. A mãe, dona Ermelinda,
iletrada, teve de assumir o papel de pai e mãe na educação e formação dos
filhos por isso, Carlos, como todos os outros timorenses, começou muito cedo a
trabalhar.
FORMAÇÃO
Além de estudar na Escola da Missão de Baucau,
Carlos Filipe, cuidava também dos animais domésticos. Depois de ter feito a 4ª
Classe em Ossú com os Salesianos, era seu professor da 4ª Classe o irmão João
Benezatto, (trabalhou também na Madeira e encontra-se sepultado no Cemitério de
São Martilho). Terminada a 4ª Classe, Carlos pediu para entrar no Seminário
diocesano de Dare orientado pelos Jesuítas. Concluído o 6º Ano, o Bispo Dom
José Joaquim Ribeiro, recomendou-lhe insistentemente que não se fizesse
salesiano, mas o jovem Carlos Filipe, com voz firme e serena, disse que “é uma
força maior que me empurra para os salesianos”.
De 1969 a 1973 esteve em Portugal para a sua
formação, tornando-se salesiano em Setembro 1973. Concluído o estudo da
Filosofia regressou a Timor, mais propriamente a Fatumaca, onde fez o seu
apostolado entre os seus conterrâneos e lecionou no Ciclo Preparatório. Dentro
deste âmbito de formação, frequentou um Curso de Reciclagem em Agosto 1975 em
Dili. Aconselhado pelo Pe. Martinho da Costa Lopes, na altura Vigário Geral,
partiu a pé com outros refugiados para Atambua, devido ao conflito interno
entre irmãos. De Atambua seguiu para Macau a fim de concluir o seu estágio
iniciado em Fatumaca. Terminado o estágio, prosseguiu os estudos de Teologia na
Universidade Católica Portuguesa entre 1976-1979, recebendo no final o
bacharelato em Teologia. Foi depois enviado para frequentar a Universidade
Pontifícia Salesiana em Roma, onde concluiu a licenciatura summa cum laude em
Teologia Pastoral.
SACERDOTE E BISPO
No dia 24 de Janeiro de 1980 foi ordenado diácono
por D. António Javierre Ortas, SDB. No mesmo ano, a 26 de Julho, foi ordenado
sacerdote em Lisboa por D. José da Cruz Policarpo, seu professor na
Universidade Católica Portuguesa. Regressou a Timor em Julho 1981 onde
desempenhou o cargo de mestre de noviços de 8 de Dezembro 1981 a 8 de Dezembro
1982 em Fatumaca. Depois, foi nomeado Diretor do Colégio de Fatumaca a 20 de
Março de 1983, mas teve pouco tempo para exercer esta missão, porque nos
primeiros dias do mês de Maio chegou um telegrama do Núncio Apostólico em
Jakarta pedindo a comparência do Pe. Carlos Filipe na Nunciatura. Já era noite
quando ele lá chegou. No dia seguinte, o Núncio comunicou-lhe: “Olha, Pe.
Ximenes, o Santo Padre nomeia-te Administrador Apostólico de Timor. Agora vais
para a capela e rezas. E depois, quando voltares, dizes que aceitas.” O jovem
padre salesiano recordou-se que Dom Bosco recomendava muito a obediência ao
Papa. Um desejo dele, deveria ser uma ordem. Assim, numa atitude de serviço à
Igreja, assinou o documento e regressou a Timor.
Cinco anos depois, a 21 de Março de 1988, Dom
Ximenes foi eleito Bispo titular de Lorium, conservando o cargo de
Administrador Apostólico e a 19 de Junho deu-se a sua ordenação episcopal. Para
o lema do seu episcopado escolheu a frase de São Paulo: “Caritas Veritatis,
Veritas Caritatis” (Caridade na Verdade, Verdade na Caridade), lema que o
norteou na sua entrega e dedicação ao Evangelho e na defesa dos Direitos
Fundamentais do seu povo.
ACONTECIMENTOS QUE SE SEGUEM
Com o tempo, tornou-se a única voz timorense que
insistentemente apelava para a paz e a liberdade e teve a coragem de condenar
publicamente a crueldade e o abuso das forças armadas, a guerra psicológica e
as constantes violações dos direitos humanos, entre outros, “o massacre de
Crarás”.
Como bispo visitava todas as paróquias e capelas
espalhadas por Timor, onde foi sempre acolhido com muita fé e carinho. Nos
tempos fortes da Igreja, sobretudo Advento e Quaresma, escreveu muitas Cartas
Pastorais, para partilhar os momentos da vida da igreja e dar orientações aos
cristãos para uma vivência prática da Fé. Denunciou veementemente, não só as
bárbaras práticas ofensivas dos ocupantes, mas também a maneira como os da
guerrilha tratavam os seus irmãos deixando-os sofrer ao Deus dará.
Para além de encontros com autoridades civis,
religiosas e militares da Indonésia, Dom Ximenes teve também encontros em Ossú
e Fatumaca com o Comandante em Chefe, Kayrala Xanana Gusmão, trocando com ele o
seu ponto de vista acerca das consequências que o povo enfrentava diariamente
por causa do conflito que opunha timorenses e indonésios, mas igualmente entre
os próprios timorenses. Dom Ximenes escreveu ainda a muitas figuras
mundialmente reconhecidas pedindo ajuda para o oprimido povo timorense e apoio
para a promoção de um futuro independente para o povo de Timor-Leste. Dom
Ximenes foi perseguido pelas autoridades indonésias e, por duas vezes,
atentaram contra a sua vida. No dia 6 de Fevereiro 1989 escreveu ao
secretário-geral da ONU, Javier Pérez de Cuellar, reclamando por um referendo
sob os auspícios da ONU, sobre o futuro de Timor-Leste e pela ajuda
internacional ao povo timorense que estava “a morrer como povo e como nação”.
O Papa João Paulo II, mostrando a sua solidariedade
para com esta igreja, visitou e celebrou a Eucaristia em Tasi-Tolu, onde
presenciou também a manifestação dos jovens após a Missa, no dia 12 de Outubro
de 1989. Com esta visita, Sua Santidade colocou de novo o problema de Timor na
arena internacional. Porém, a situação veio a piorar quando o Bispo Dom Ximenes
Belo deu abrigo na sua própria residência a jovens que tinham escapado ao
massacre de Santa Cruz, no dia 12 de Novembro de 1991 e denunciou os números
das vítimas mortais (mais de duzentos) que os ocupantes desmentiram afirmando
que tinham sido apenas 19 mortos e 91 feridos. Número que é lançado ao ar como
poeira, devido ao trágico acontecimento daquele ano 1991. Convidado pelo
Secretário-Geral da ONU, Dom Ximenes participou no “Encontro Intra-Timorense”,
patrocinado pela ONU em Burg Schlaining, na Áustria.
A obra corajosa deste bispo em prol dos timorenses
e em busca da paz e da reconciliação, bem como a sua oposição aos massacres de
timorenses, valeram-lhe a hostilidade do regime de Jacarta, por essa razão, e
por ter sempre procurado romper o isolamento de Timor-Leste, chamando a atenção
do mundo para o que ali se passava, foi internacionalmente reconhecida quando,
em conjunto com seu compatriota o ativista de Timor-Leste no exterior, Dr. José
Ramos-Horta, foi-lhes entregue o Prémio Nobel da Paz a 10 de Dezembro de 1996.
No seu discurso afirmou: “Como bispo deste povo vejo o Prémio Nobel da Paz não
como algo meramente para homenagear uma pessoa, mas como homenagem legítima
pelo trabalho desenvolvido pela Igreja Católica em Timor, defendendo os
direitos inaliáveis do seu povo (...). O que o povo quer é a paz, o fim da
violência e o respeito pelos Direitos Humanos. Tenho a esperança de que o
Prémio Nobel da Paz promoverá estes objetivos.» Na sequência deste
reconhecimento, D. Ximenes Belo teve oportunidade de se reunir com Bill
Clinton, Nelson Mandela e várias entidades civis, religiosas e mesmo militares
para falar sobre a realidade que se vivia em Timor-Leste. Não tardou, seis anos
depois, a 20 de Maio de 2002, no mesmo sítio onde João Paulo II havia celebrado
a Eucaristia, vê-se a Bandeira da República Democrática de Timor-Leste
erguer-se majestosamente no mastro, assinalando assim o nascimento do primeiro
País do século XXI, também com a presença de Maria na efígie da estátua de Nª
Sª de Fátima, para além dos convivas que celebravam jubilosamente entre lágrimas
este histórico e memorável acontecimento.
Com a saúde enfraquecida, Dom Ximenes Belo pediu ao
Papa João Paulo II, em Novembro daquele ano, a sua demissão como Administrador
Apostólico e partiu para Portugal que o acolheu para tratamento médico. Em 2004
aceitou ser missionário em Moçambique mas por motivos de saúde, um ano depois,
regressa de novo a Portugal, onde se encontra até a presente data. Em Portugal,
além de colaborar com os sacerdotes na Pastoral, é também convidado para falar
da paz, direitos humanos, justiça, solidariedade ou temas inerentes à vida da
Sociedade, não só em Portugal mas também noutros países.
No seu tempo livre, para além de escrever a
História da Igreja de Timor-Leste, que em breve irá para o prelo, publica
também resenhas em artigos dos jornais acerca da História da Igreja de Timor.
Alguns autores solicitam-no para escrever o Prefácio dos seus livros.
Recentemente publicou dois livros: “OS ANTIGOS REINOS DE TIMOR-LESTE” e “DOM
FREI MANUEL DE SANTO ANTÓNIO”.
Em homenagem ao Bispo Dom Jaime Garcia Goulart, que
foi Bispo de Dili desde 1945 a 1967, Dom Ximenes visitou a freguesia da
Candelária na ilha do Pico, Açores. Em homenagem ao Capitão Armando Pinto
Correia, madeirense natural do Estreito Câmara de Lobos que esteve a trabalhar
nos anos 30 na terra de Dom Ximenes em Baucau e escreveu o livro “Gentio de
Timor”, livro “considerado pelo antropólogo Arnold Gennep, na Revista Mercure
de France (1936), como um dos melhores livros do Mundo, enquanto monografia de
um povo”, Dom Ximenes visitou a ilha da Madeira entre 11 a 15 de Novembro de
2009, por ocasião do lançamento da 2ª edição do livro "Gentio de
Timor".
D. Ximenes Belo esteve na Guarda, entre os dias 7 e
11 de Julho de 2008, a orientar um retiro de sacerdotes da Diocese, realizado
no Centro Apostólico da Guarda. O Jornal «Guarda» fez-lhe uma entrevista que
foi publicada no dia 18 de Julho de 2008 da qual retirámos um pequeno extrato:
«A Guarda: Qual o papel da Igreja Católica no
processo de independência de Timor-Leste?
D. Ximenes Belo: Não foi um problema político,
portanto, não se pode falar no papel da Igreja Católica na independência de
Timor-Leste. É mais um papel de moral, de proteção das pessoas, dos que sofrem,
dos débeis, dos direitos humanos, sobretudo na defesa da justiça, da paz e dos
direitos humanos. Era mais uma voz moral, um suporte moral para a população, do
que propriamente uma força política, porque nós não nos sentíamos como
políticos, o nosso trabalho era na pastoral, ao nível da justiça e da paz».
Dom Ximenes Belo é mesmo um homem de paz: nos
gestos, na simpatia, na afabilidade e até na maneira delicada e bondosa como
fala. Parabéns Dom Ximenes.
Desejamos a Dom Ximenes Belo muita saúde no seu
múnus apostólico. Um abraço, Dom Ximenes.
18 de Junho 2013.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.