por Paulo Gorjão, Publicado em 08 de Março de 2011
A diversificação das relações deveria constituir uma prioridade estratégica, de modo a atenuar o impacto da hegemonia indonésia e australiana
No livro "Tirania da Distância", o historiador australiano Geoffrey Blainey descreveu e analisou o modo como a distância a que a Austrália se encontrava da metrópole inglesa foi decisiva para moldar a sua identidade e a sua história. Invariavelmente, sempre que abordo as relações entre Portugal e Timor-Leste, lembro-me da relevância que Blainey atribuía à distância e ao modo como esta parece ser também muito importante para explicar as relações passadas, presentes e futuras entre Lisboa e Díli.
Quase uma década depois da independência de Timor-Leste, as relações bilaterais entre Portugal e Timor-Leste resumem-se, em larga medida, aos laços afectivos e históricos que, sendo naturalmente relevantes, são insuficientes para dar maior espessura e solidez ao relacionamento entre os dois países. Em retrospectiva, uma breve análise das relações bilaterais impõe a conclusão de que os últimos anos constituíram uma década perdida no que se refere à consolidação das relações bilaterais.
Este progressivo distanciamento é compreensível, por um lado. De certo modo, essa tendência corresponde à normalização de uma relação que foi, durante muito tempo, anormalmente emotiva, fruto das circunstâncias históricas que tiveram o seu epílogo com o referendo em 1999 e a independência de Timor-Leste em 2002. Mas, por outro, este afastamento é incompreensível, na medida em que reflecte a ausência de uma estratégia multidimensional, sobretudo da parte de Díli, que é quem tem mais a perder com o progressivo distanciamento bilateral.
Perante dois vizinhos poderosos, deveria constituir uma prioridade estratégica para Timor-Leste a diversificação das suas relações, de modo a atenuar o impacto da hegemonia indonésia e australiana. Nessa medida, a aposta na consolidação das relações bilaterais com a China, com o Japão, ou com Portugal, para citar apenas três casos, revelaria o mais elementar bom senso político.
Ora, na última década, se olharmos para além das declarações de circunstância, constatamos que Timor-Leste não fez tudo o que devia para manter vivo o relacionamento bilateral com Portugal. De facto, nos últimos anos, Díli pouco ou nada fez para assegurar o investimento de grandes empresas portuguesas - banca, telecomunicações, construção civil, energia - em Timor-Leste. E encerrada que parece estar a janela de oportunidade, tanto no plano político, como no económico, é notória a ausência de uma rede sólida de interesses comuns.
Ultrapassado que está o ciclo da boa vontade que caracterizou o período pós-independência, em que por vezes os investimentos não foram ditados apenas por critérios de estrita racionalidade económica, são poucos os interesses portugueses que restam em Timor-Leste - e mesmos esses, por vezes, parecem ser pouco acarinhados, como é o caso da Portugal Telecom - e menos ainda aqueles que planeiam investir no território num futuro não muito distante.
Perante este cenário de escassos interesses políticos e económicos em comum, se nada for feito, a relação bilateral manterá o seu plano inclinado na próxima década. Resta saber se os dois países aceitam que assim seja ou se, pelo contrário, vão à luta contra a tirania da distância.
Director do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS)
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