PM TL Xanana Gusmao |
É uma grande honra usar da palavra nesta III Conferência Internacional da ONU sobre um tema tão importante para o futuro colectivo e sustentável da humanidade – “ o desenvolvimento sustentável de pequenos Estados-ilha através de parcerias genuínas e duradouras”. Gostaria de agradecer ao povo e ao governo de Samoa pela organização deste evento e pela forma tão calorosa e hospitaleira como nos receberam.
À semelhança de todos os pequenos Estados, Timor-Leste foi colonizado durante séculos e só muito recentemente alcançou a sua soberania. Neste curto período de 12 anos de independência, Timor-Leste tem vindo a construir a sua nação, estando classificado como Estado ‘frágil’ e ‘vulnerável’. Embora não possa contestar esta classificação, é importante fazer a distinção entre as instituições do Estado e as pessoas que compõem o Estado. Se por um lado tenho de admitir que as nossas instituições estatais são ainda frágeis, por outro lado posso afirmar que o nosso povo é resiliente e está determinado em construir um futuro melhor para os nossos filhos.
Em Timor-Leste podemos estar distantes dos centros de poder globais, porém isso dá-nos a oportunidade e o tempo para olhar com atenção para o que vai acontecendo no mundo. Permite-nos ter uma perspectiva diferente que não é condicionada pelas ortodoxias económicas e políticas.
É uma perspectiva na qual é impossível ignorar que existem 2,2 mil milhões de pessoas a viver em situação de pobreza e em nações frágeis e afectadas por conflitos; nações estas que não irão concretizar um único Objectivo de Desenvolvimento do Milénio até à data prevista de 2015.
É uma perspectiva que nos permite ver que somos muito mais fortes enquanto Estados nação quando nos unimos para formar parcerias e alianças; quando reconhecemos os nossos desafios comuns e as nossas vulnerabilidades comuns.
É por isto que a minha pequena nação de Timor-Leste tem vindo a trabalhar em parceria com 19 outras nações caracterizadas como “nações frágeis e afectadas por conflitos”, a fim de garantir que as nossas vozes são ouvidas em debates que visam encorajar o desenvolvimento sustentável na agenda pós-2015.
A nossa parceria chama-se ‘g7+’ e inclui pequenos Estados-ilha, a maior parte dos quais está hoje aqui presente nesta conferência.
A parceria do‘g7+’ é uma associação voluntária de países que são ou foram afectados por conflitos e que estão agora a fazer a transição para a próxima etapa do desenvolvimento. O principal objectivo do ‘g7+’ é partilhar experiências e aprender uns com os outros, bem como defender reformas ao modo como a comunidade internacional trabalha em Estados frágeis e afectados por conflitos.
Por exemplo, estamos a defender com viva voz que o novo conjunto de objectivos de desenvolvimento sustentável global deve incluir um objectivo autónomo sobre ‘sociedades pacíficas e inclusivas, estado de direito e instituições capazes.’ Aprendemos às nossas custas que não é possível haver desenvolvimento sem primeiro haver paz e estabilidade.
O‘g7+’está igualmente a defender acções a nível das alterações climáticas. As alterações climáticas são uma das maiores ameaças à estabilidade global, bem como à própria existência de muitos pequenos Estados-ilha. Infelizmente não há questão que melhor demonstre a concentração do poder e a negligência e o egoísmo dos ricos do que a resposta mundial à ameaça das alterações climáticas.
O documento do Consenso de Díli, lançado no final de uma conferência sobre desenvolvimento internacional realizada em Timor-Leste,em Março de 2013, reconheceu a realidade vivida das alterações climáticas e concluiu com a seguinte nota:
“Não fazemos parte da causa das alterações climáticas, nem tão-pouco podemos gerir sozinhos os seus efeitos inevitáveis. Precisamos responsabilizar os países que mais contribuem para o problema e granjear apoio internacional para a mitigação, adaptação e redução do risco de desastres no que se refere às alterações climáticas. Embora as nossas negociações globais continuem a não encontrar soluções, essa é mais uma razão para colocar as alterações climáticas firmemente na agenda de desenvolvimento e para criar resistência contra os impactos que já não podem ser evitados.”
O Presidente do Palau levantou anteriormente uma questão importante: “quem irá estar ao nosso lado neste compromisso?” É importante que na Cimeira do Clima, a realizar durante este mês em Nova Iorque, possamos obter a resposta certa a esta pergunta.
E já hoje o Primeiro-Ministro das Ilhas Cook pôs a questão de uma forma muito clara, ajudando-nos a todos a perceber o problema da falta de empenho global.
Senhoras e senhores,
As alterações climáticas não dizem respeito somente à subida do nível do mar e à mudança das condições climatéricas. Prendem-se igualmente com segurança alimentar, pobreza, saúde e acesso a água potável. A degradação ambiental, o aumento da insegurança em termos de alimentos e recursos, as pressões populacionais e as migrações internas e externas são apenas alguns dos factores que colocarão em risco Estados já de si vulneráveis e que irão acirrar tensões globais.
As alterações climáticas são assim uma ameaça frontal clara à estabilidade de muitas pequenas nações-ilha. O que o mundo precisa entender é que as alterações climáticas ameaçam também a segurança internacional e que se não tivermos alicerces de estabilidade e paz podemos esquecer as nossas ambições a nível de desenvolvimento sustentável. Estimados amigos,
Temos diante de nós uma oportunidade para garantir que a agenda de desenvolvimento pós- 2015 é verdadeiramente transformadora e que desta vez ninguém é deixado para trás. Apelo a todos nós para que agarremos a oportunidade que esta Conferência nos dá no sentido de acordarmos acções específicas para conduzir a mudança. Se me permitirdes, gostaria também de recomendar que evitemos planos excessivamente ambiciosos, em face das consequências globais da crise financeira internacional. Devemos assim adoptar programas mais realistas, faseados e viáveis. A agenda deve respeitar a distribuição equitativa de ajuda, consoante as necessidades e as prioridades de cada país. Sou totalmente favorável ao estabelecimento de melhores mecanismos de monitorização, responsabilização e implementação, tal como o Primeiro-Ministro da Papua Nova Guiné e o representante da União Europeia referiram aqui hoje. Ouvimos também o Primeiro-Ministro de Tuvalu expressar tanto a ansiedade como a esperança dos pequenos Estados-ilha.
Se assim for, então SAMOA será verdadeiramente um grande passo em frente para que isto se torne realidade.
Nessa altura, e tal como o Presidente das Seychelles acredita no seu povo, poderemos também regressar a casa para junto dos nossos povos fortes e determinados, e canalizar a sua energia para construir instituições e parcerias globais mais fortes; parcerias estas que deverão assentar na confiança e responsabilização mútuas entre os parceiros de desenvolvimento e os recipientes.
Precisamos agir juntos com força, coragem e união. O desenvolvimento sustentável, o progresso global e o próprio futuro dos povos de alguns pequenos Estados-ilha dependem disso.
A noite passada, na Cerimónia Cultural de Abertura da Conferência, tivemos o melhor exemplo de como todos nós podemos trabalhar juntos como verdadeiros parceiros, assistindo às actuações incríveis de mais de 500 samoanos jovens e talentosos a trabalhar em harmonia. Todos nós devemos seguir este exemplo inspirador.
Fa’afetai Lava
Apia, Samoa
1 de Setembro de 2014
Kay Rala Xanana Gusmão
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