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20110921

TIMOR-LESTE ORGANIZA III ASSEMBLEIA PARLAMENTAR DA CPLP

DISCURSO DE ABERTURA DA III ASSEMBLEIA PARLAMENTAR DA CPLP PROFERIDO POR SUA EXA.

O PRESIDENTE DO PARLAMENTO NACIONAL DE TIMOR-LESTE

FERNANDO LA SAMA DE ARAÚJO

21 DE SETEMBRO DE 2011

Exmos. Senhores

Presidentes,

Secretário Executivo da CPLP,

Membros do Corpo Diplomático,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhoras e Senhores Convidados,

É com grande honra que dou início aos trabalhos da III Assembleia Parlamentar da CPLP e que, em nome do povo timorense, dou as boas vindas aos nossos irmãos lusófonos. É também, com grande satisfação que pela primeira vez, Timor-Leste e o Parlamento Nacional, acolhem uma reunião com tão distintos participantes, que só prestigiam esta Casa.

Quando, no século XV, Portugal se voltou para o mar e decidiu vir ao encontro dos nossos povos, estava longe de pensar que estaria a criar de algo novo, inovador e original. Ao sair das suas fronteiras, deu e recebeu sem qualquer ideia de absorção ou de adaptação e nasceu algo de novo, diferente do ponto de partida.

Houve períodos negros e conturbados mas o resultado final pode-se traduzir numa ligação entre os povos que garante que cada cultura, cada identidade se situem tal como estão, assim se relacionando e respeitando. Não houve pretensão de alterar o que já existia, e esta é grande virtude da presença portuguesa no mundo, e que a distingue dos outros. Houve, isso sim, uma troca de culturas que se traduziu num cadinho de várias influências que nos tornou a todos mais ricos. Certamente, se não tivesse havido esta troca permanente ao longo destes últimos cinco séculos, estaríamos hoje mais pobres.

Cultura de várias línguas e língua de várias culturas misturaram-se de uma forma complexa, encontrando um denominador comum: a capacidade de encontrar lugar para exprimir sentimentos comuns, a partir do princípio universal da dignidade das pessoas.

Ainda hoje fico impressionado quando viajo ao Brasil, Angola ou outro país lusófono e, apesar de estar tão longe, tenho aquela estranha sensação de estar em casa, de não estar no estrangeiro. Como foi possível chegar aqui?

Esta sensação faz-me sentir tão perto da ideia de Padre António Vieira que, no longínquo século XVII, falava da importância da criação de um império, não político, mas de dons e graças e feito de cultura e de espírito.

Séculos depois, continuamos ligados por algo que não se explica facilmente. Não é por dinheiro ou influência política, mas sim por algo que nos distingue e diferencia dos outros povos, encontramo-nos acima de tudo ligados por uma cultura permanente de afetos e de teimosia de estarmos juntos.

Senhores Presidentes,

Senhoras e Senhores Deputados,

A base fundamental para a continuidade desta cultura que nos faz a todos mais ricos é a língua que nos une. A língua que, apesar de se chamar portuguesa, é de todos nós. É tão portuguesa, como timorense, angolana, guineense, santomense, caboverdiana, moçambicana ou brasileira. E é de uma riqueza que continua a crescer, pois todos os dias se adapta à realidade local nos nossos países, mais uma vez sem a pretensão de alterar, mas apenas de descobrir um lugar comum para que nos possamos encontrar.

Foi assim que nasceu a CPLP, como um elo fundamental de ligação entre os nossos povos. A língua é o principal elemento que nos une, mas neste campo há ainda muito a fazer, não só ao nível local através do desenvolvimento da língua nos nossos países, sobretudo em Timor-Leste e na Guiné-Bissau, onde existem programas específicos de apoio ao desenvolvimento da língua, mas também no plano internacional, garantindo que a língua portuguesa se torne idioma oficial das organizações internacionais, como as Nações Unidas e União Inter-Parlamentar. Lembro que o português já é língua oficial das grandes organizações regionais como a União Europeia, a União Africana e o Mercosul.

A Língua Portuguesa é uma das línguas mais faladas no mundo, mas não é apenas por este motivo que defendemos que deve ser idioma oficial das Nações Unidas. É também e sobretudo por ser um laço cultural de povos de todas as latitudes e por ser um veículo privilegiado por transportar o património imaterial da humanidade: é um elemento de solidariedade fundamental multiétnico, que as Nações Unidas não podem, nem devem ignorar.

Para além da Língua Portuguesa, a CPLP e nós os Parlamentos de Língua Portuguesa temos outros desafios aos quais é fundamental dar resposta, nomeadamente o desenvolvimento humano, estrutural e económico dos nossos países.

Temos que criar condições para que haja nos nossos países um crescimento económico sustentado, a inclusão social e a plena vigência da democracia. Devemos garantir políticas públicas firmes e transparentes e de acesso a oportunidades, devolvendo aos mais pobres a dignidade e a cidadania, para que eles também possam colaborar neste esforço coletivo. O desenvolvimento dos nossos países, ainda não é, mas deveria ser uma responsabilidade coletiva.

Reconhecemos que a independência foi difícil e nalguns casos foi necessário recorrer à luta armada e ao conflito, mas apesar de terem sido as armas a nos darem a independência, são as leis que nos dão a liberdade. E aqui, nós parlamentares, temos a máxima responsabilidade.

Neste sentido, porque não criar uma instituição que sistematize e que promova a ajuda ao desenvolvimento nos países da CPLP? Porque razão temos que estar dependentes dos outros, se nos nossos países há experiências tão bem sucedidas e que seriam de fácil replicação. É fundamental promover a cooperação e interação a este nível entre os nossos países. Acredito que é possível fazer política externa com humanismo, sem perder de vista o interesse nacional. A política externa não tem que ser baseada no axioma que o interesse nacional se sobrepõe a tudo e a todos, esquecendo princípios fundamentais de relacionamento entre Estados. Esse nunca foi o espírito que presidiu aos nossos países e à forma como sempre os países lusófonos se relacionaram com o mundo. Desde sempre, têm e sempre tiveram um compromisso inabalável com os Direitos Humanos e por essa razão muita da política externa que se tem desenvolvido no mundo na última década nos parece estranha e de difícil compreensão. Podemos ser nós, a bem da humanidade, a promover uma forma alternativa de estar no mundo.

Senhores Presidentes,

Senhoras e Senhores Deputados,

Para além da cooperação e ajuda ao desenvolvimento, é também fundamental sistematizar o comércio e desenvolvimento económico no espaço CPLP. Temos juntos que encontrar uma forma de coordenar a comunicação entre os agentes económicos da CPLP, ajudando os nossos países a desenvolver as suas potencialidades geográficas e produtivas de modo a que diminuam a sua dependência de alguns centros económicos regionais. É fundamental encontrarmos modalidades mais inteligentes e mais ágeis de cooperação económica, que explorem a posição geográfica dos países da CPLP nos diversos continentes, para que no futuro se crie uma genuína zona global de paz e prosperidade.

Na Conferência dos Presidentes propus a criação de um grupo de trabalho que estudasse com pormenor a constituição de uma agência de cooperação e desenvolvimento económico no âmbito da CPLP. É fundamental que sejamos nós, os países que falam português a cooperarem uns com os outros nos momentos mais difíceis. Não faz grande sentido que, existindo capacidade humana e financeira, nos nossos países estejamos constantemente dependentes de outros Estados ou Organizações Internacionais, fora da família da CPLP. Antes de procurarmos ajuda humana ou financeira noutros países ou instituições, temos a obrigação de esgotar essas possibilidades entre nós. Aplica-se o mesmo princípio na vida privada, antes de pedirmos ajuda a outros amigos, consultamos e pedimos auxílio à família.

Sobre esta matéria, o Vice-Presidente do Parlamento Nacional de Timor-Leste Vicente da Silva Guterres, irá falar na sua intervenção mais adiante nos trabalhos desta Assembleia.

Uma outra questão que gostaria de abordar prende-se com a forma de alargar o nosso espaço e com vista à criação desta zona como uma zona de paz e prosperidade económica. Neste sentido, proponho que se crie um grupo que estude a alteração dos estatutos da AP-CPLP de modo a que, à semelhança da CPLP, fossem criadas as figuras jurídicas do Observador Associado e do Observador Consultivo. Deste modo podemos permitir que a AP-CPLP se alargue, contribuindo para fortalecer a CPLP na sua área específica de intervenção. Porque não incluir as Assembleias Legislativas de Goa, Malaca e Macau, como Membros Observadores da AP-CPLP? Ou a União Inter-Parlamentar e o Parlamento Europeu como Observadores Consultivos? Desde que partilhem os mesmos princípios orientadores, designadamente no que se refere à promoção das práticas democráticas, à boa governação e ao respeito dos direitos humanos, e prossigam, através dos seus programas de governo, objetivos idênticos aos da AP-CPLP, porque não partilhar com estas instituições a nossa experiência?

Desta maneira, a Assembleia Parlamentar da CPLP ao alargar o seu campo de atuação estará necessariamente a fortalecer a sua capacidade de interação com regiões e países que, apesar de não falarem a língua portuguesa, não vêem como estranha a nossa presença, pois contam com séculos e séculos de convivência comum.

Com efeito, em relação à Ásia, Timor-Leste tem uma especial responsabilidade, pois é o único país da CPLP que se encontra neste continente, conferindo o carácter verdadeiramente global da CPLP.

Por isso, Timor-Leste tem a seu cargo a obrigação de ajudar a abrir as portas dos mercados asiáticos aos países da CPLP. Em breve, faremos parte da maior organização regional, a ASEAN, e estará à nossa disposição um mercado de várias centenas de milhões de pessoas, ávidas de consumo e de produtos novos produzidos noutras partes do mundo.

Por fim, quero apenas dar conhecimento a esta Assembleia, e sobretudo à delegação da Assembleia da República Portuguesa, que deu entrada na Mesa do Parlamento Nacional, um projecto de resolução a sublinhar o papel altamente relevante na luta pela independência do nosso país, que a “Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação de Timor-Leste” teve. Esta Comissão Eventual funcionou na Assembleia da República Portuguesa de 1981 a 2002 e num esforço incansável, em momentos em que tudo parecia perdido, mantinha a chama acesa do debate em torno da independência de Timor-Leste. Por esta razão, o Parlamento Nacional não poderia deixar de sublinhar e agradecer o empenho incansável de todos os deputados portugueses ao longo dos 21 anos de funcionamento desta Comissão. Peço por isso, ao Sr. Vice-Presidente da Assembleia da República Portuguesa Dr. Ferro Rodrigues, que transmita esta notícia à Senhora Presidente da Assembleia da República, que infelizmente, devido a outros afazeres, não pode estar presente nesta Assembleia.

Termino citando um poeta da nossa língua, Fernando Pessoa, numa alusão àquilo que ainda ficou por fazer e que está nas nossas mãos continuar: “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce. Deus quis que a terra fosse toda uma, que o mar unisse já não separasse.”

Numa era global, de grande competitividade, temos hoje a obrigação de fazermos aquilo que já fizemos com muito sucesso durante séculos!

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