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20080629

ALBERTO OSÓRIO DE CASTRO

Por Dom Ximenes Belo
Ocorre este ano, o primeiro centenário da publicação da poesia “FLORES DE CORAL”, na Imprensa nacional de Dili, Colónia de Timor, em 1908. Para recordar este insigne escritor e poeta, envio ao “Forum Hakseskuk” este pequeno trabalho, que é uma humilde homenagem ao Poeta Osório de Castro.

Alberto Osório de Castro foi um notável escritor e poeta. Nasceu em Coimbra em 1868 e morreu em Lisboa no dia 1 de Janeiro de 1946. Chegou a Timor em 1908 e ali esteve até 1911. Enquanto jovem, Osório de Castro estudou na Universidade de Coimbra, juntamente com António Nobre e Eugénio de Castro e publicou o jornal literário Boémia Nova e era amigo do poeta Camilo Pessanha. Durante a sua permanência em Timor, exerceu o cargo de Juiz do Tribunal de Dili. Osório de Castro foi autor do livro Flores de Coral: Poemetos e Impressões da Oceânia Portuguesa, publicado em Dili, em 1908. Algumas das poesias foram publicadas em 1928 na Seara Nova (n.º 1123, 28 de Abril de 1928). O Livro Flores de Coral, depois de revisto foi publicado em 1943 com o título A Ilha Verde e Vermelha de Timor, pela Agência Geral das Colónias. Vejamos alguns poemas feitos em Lahane (1) Timor:


1. FLORES DE CORAL

Dispersos pelos mares,
Alguns dias de luz me alvorejaram.
Ondas d’oiro no nácar dos luares
O meu sonho embalaram,
E em flores de coral, sob os palmares,
Rolaram-no, e passaram.

2. À CASUARINAS DO CEMITÉRIO DE DILI

Sonho escuro dos mortos embalai,
Prece das casuarinas! (2)
Vozes vagas dos mortos, ciciai
Nas folhagens franzinas!
Já no céu, resplandece esmorecendo
A púrpura do dia.
Passa a aragem do pântano gemendo
Na romagem sombria.
Que murmuram as bocas das raízes
Aos mortos a sonhar?
Que lhes dizes, ramagem? Que lhes dizes,
A reza e a embalar?
(Lahane, Timor, Abril de 1908).

3. TEBEDAI (3)

Bailemos, bailemos à luz do luar,
Que a vida não pára, lá vai passar.
Na sombras do verde gondão (4) de mil braços
Já voam as moscas-de-fogo aos abraços.
Reparem! Lá dançam no luar as estrelas,
Sárão (5) todo d’oiro, doiradas chinelas.
Era uma vez um malai (6) português
Que em todo o batuque dançava por três.
Tanto bailou com as moças alegres
Tanto bailou que lhe deram as febres.
Tanto bailou e tornou a bailar,
Que até para a cova lá foi a dançar.
Bailemos, ao som dos sagueiros.(7)
Não têm toada mis fina os ribeiros.
Suspiros das folhas do verde gondão,
Abraços e beijos, são do coração.
Bailemos, bailemos, à luz do luar,
Que a vida não pára, lá vai passar.

(Lahane, Timor, Junho de 1908).

4. FULAN NAROMAN (8)

A infinda noite opalescente
Sobe, arrebatadoramente,
A fugir de todo o olhar,
Céu tão claro, tão surpreendente,
Que sente a alma, longinquamente,
Como um voo do céu aflar.
A asa translúcida e nevada
Roça de leve a cumeada,
Adeja, e perde-se a alvejar
Na azulada noite doirada...
Presença alada enamorada
Da imensidade do luar.

(Lahane, Timor, Abril de 1908).

5. REISEBILDER, ( sobre o percurso da viagem ) (....).

E eis-te no fim do mundo,
Costa verde e vermelha de Timor!
Mas que divina, extraordinária cor,
A do teu céu, a do teu mar profundo!
É d’oiro a manhã de Dili.
Trilla tão lindo o corlílli. (9)
Na frescura das ribeiras.
Murmura perpetuamente
A verde sombra virente
Das gaboeiras (10)
À contemplação da paisagem em Fahi-ten (11)
Saudades são a lembrança
Dalgum bem que nos deixou
P’ra sempre, e sem esperança
De volta, o bem que passou.
E passa mesmo a lembrança
De todo o bem que findou
Depois de uma viagem de regresso Lahane
Alto vale de Lahane, ermo e divino,
No murmúrio das águas! Quantos dias
Por tuas sombras divaguei, absorto
Na beleza da vida morredoira,
Face do mundo misteriosa e vária...
Notas explicativas de alguns termos.
  1. Lahane, é uma freguesia da cidade de Dili, situada nas colinas a sul da planície de Dili, Por causa do clima mais ameno, as autoridade coloniais escolheram este local para zona residencial e para o hospital. No tempo colonial, foi aí construída a Residência dos governadores; foi sede das Missões Católicas (1878-1940). Foi em Lahane que se escondeu comandante da guerrilha Xanana Gusmão em 1992 e aí foi capturado pelos comandos indonésios. Há um romance “O Menino de Lahane“, da autoria de Nídio Duarte.
  2. Casuarinas, (é uma árvore), casuarina junghuniana, em Tetun– Ai-kakeu. Nalgumas zonas, o arvoredo do Kakeu serve para ensobrear os cafezais; a madeira é usada em postes, vigas e larazes. No seu livro “Timor Leste, Um Povo uma pátria, Xanana Gusmão fala do sibilar das folhas do Kakeu, quando movidas pelo vento: “ ...sob o gemido tristonho dos Kakeus”.(p.2).
  3. Tebedai, dança efectuada pelas mulheres. Por ocasião das festas, as mulheres dançam ao som d e instrumentos que em Tetum se dizem “babadok” e “dadir.” Na zona leste, as mulheres ao mesmo tempo que tocam o babador, formam um círculo e executam um movimento lento para trás e para frente; os homens, animados pelo som da música, saltam para o centro do círculo brandindo lenços e espadas. Na parte ocidental, o grupo dos homens correm à frente, e as mulheres, tocando o tebedai, seguem-nos dançando e meneando-se. A dança executada pelos homens ou rapazes, chama-se Bidu.
  4. Gondão, ou gondoeiro, (é uma árvore frondosa; algumas têm raízes aéreas). ficus benjamina, em Tetum – Hali. Para alguns timorenses é considerada sagrada (lulik). Na história de Timor, houve um reino importante, que dominou outros reinos do centro de Timor para o oriente. We-Hali ou Bé-Hali ( a nascente que jorra do tronco d Gondoeiro, ou o Hali em cuja sombra brota a nascente), ou como dizia o padre Artur Basílio de Sá, “gondão da água”. (cf. Textos em Teto da Literatura Oral Timorense, p.232-233).Era nos troncos ou ramos do hali que os vencedores da guerra penduravam as cabeças cortadas dos vencidos.
  5. Sarão, ou sarong (em Malaio), em Tetum pode ser lipa ou kambatik. (pano de tecido usado pelas mulheres nos países do sudoeste asiático). A Lipa de algodão era confeccionada em Singapura, Jawa, Honkong, Japão, etc. A kambatik é usada pelas pessoas nobres ou em dia de festa.
  6. Malai, significa pessoa estrangeira, ou pessoa civilizada. Estrangeiros de cor branca, malai mutin; de cor negra, malai metan; chineses, malai sina.
  7. Sagueiros, espécie da palmeiras, Raphis flabelliformis. Em Tetum Akar ou Tali tahan, de folhas em leque ou forma de sobreiro. Do tronco se extrai espécie de farinha denominado “ sagu”. As folhas servem para a cobertura das casas. Do pecíolo ou talo, extraídas as folhas, passa a chamar-se “ palapa”, e serve para a construção de paredes (em Tetum, diz-se bebak). As folhas tenras e longas servem para fazer esteiras, cestos, etc.
  8. Fulan – Lua; Naroman, brilho (Luar) ou a claridade lunar.
  9. Corlílli, segundo o autor, pássaros, de cor negro ou cinzento, e de asas brancas. Abundam nas ribeiras de Timor.
  10. Gaboieras, (o árvore de gabão) são as palmeira ainda novas.
  11. Fahi-tem, uma aldeia, do suco de Tibar, situada na estrada Dili-Ermera.

Mogofores, 29 de Junho de 2008
Dom Carlos Filipe Ximenes Belo

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